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  • Dra. Márcia Noya

COACT – Não deixe a ansiedade te dominar!

A causa mais frequente de parada cardíaca é a cardiopatia isquêmica com relato de obstrução das artérias coronárias em até 70% dos pacientes que foram ressuscitados e encaminhados de imediato para angiografia coronariana. Se o infarto do miocárdio é a causa da parada, a intervenção coronária percutânea imediata (ICP) pode salvar o miocárdio, melhorar a função circulatória e prevenir a recorrência de arritmias que ameaçam a vida, correto? Veremos a seguir.

Vamos lá! Já sabemos que pacientes com parada cardíaca que não apresentam supra desnivelamento do segmento ST ao ECG, o papel da angiografia coronária imediata ainda é motivo de debate. Faltam dados de estudos randomizados, enquanto os estudos observacionais mostraram resultados conflitantes em relação a ICP imediata na redução de desfechos cardiovasculares maiores1.


Em março de 2019, foi publicado no The New England Journal of Medicine, o estudo Coronary Angiography after Cardiac Arrest without ST-Segment Elevation (COACT Trial)2. Este foi o primeiro estudo randomizado e multicêntrico envolvendo pacientes que foram ressuscitados com sucesso após parada cardíaca fora do hospital sem supra desnivelamento do segmento ST ao ECG ou uma causa não coronariana identificada como responsável pela parada cardíaca. Foi elaborado para testar a hipótese de que pacientes que são ressuscitados com sucesso após parada cardíaca, na ausência de infarto com supra desnivelamento do segmento ST, uma estratégia de angiografia coronária imediata (e ICP se necessário) seria melhor do que uma estratégia de angiografia tardia em relação à sobrevida global. Ufa! Agora estamos embasados para indicarmos cateterismo precoce após parada cardíaca. Será? Vamos avaliar os dados publicados.

O estudo randomizou um total de 552 pacientes de 19 centros na Holanda. Foram incluídos casos de parada cardíaca fora do hospital com um ritmo inicial chocável, inconsciência após o retorno à circulação espontânea e ausência de elevação do segmento ST ao eletrocardiograma. Excluíram pacientes com evidência de infarto com supra de ST no ECG, choque cardiogênico, causa óbvia não coronariana da parada cardíaca e disfunção renal grave. O desfecho primário foi duro, avaliaram a sobrevivência em 90 dias. Os desfechos secundários, inúmeros incluíram desde sobrevida aos 90 dias com bom desempenho cerebral ou incapacidade leve ou moderada, duração do suporte de catecolaminas, marcadores de choque, recorrência de taquicardia ventricular, tempo de ventilação mecânica, sangramento maior, necessidade de terapia de substituição renal e estado neurológico na alta da unidade de terapia intensiva.

Os pacientes foram então alocados em dois grupos. No grupo de angiografia imediata (n=273), esta foi realizada o mais cedo possível – dentro de 2 horas após a randomização. No grupo de angiografia tardia (n=265), o cateterismo foi realizado após a recuperação neurológica, em geral, após a alta da UTI. Os resultados mostraram que aos 90 dias, 176 de 273 pacientes (64,5%) no grupo de angiografia imediata e 178 de 265 pacientes (67,2%) no grupo de angiografia tardia estavam vivos, dando um P = 0,51, não significativo. Nenhuma diferença significativa entre os grupos foi encontrada nos demais desfechos secundários. De antemão, vale ressaltar, que foi espetacular a porcentagem de pacientes que sobreviveram após PCR e IAMSSST, em torno de 65% nos dois grupos.

O estudo mostra claramente que a angiografia imediata não foi melhor do que uma estratégia de angiografia tardia em relação à sobrevida global em 90 dias. Os resultados não estão de acordo com os estudos observacionais anteriores, que mostraram um benefício de sobrevida com angiografia coronariana precoce. Essa diferença pode estar relacionada à natureza observacional dos estudos anteriores, ou seja, viés de seleção. Podemos inferir que, nesses estudos, observacionais, os pacientes que tinham um melhor prognóstico foram encaminhados para a estratégia de angiografia imediata, distorcendo, assim, o resultado final.

A mensagem passada é que sejamos parcimoniosos na indicação do CATE nesse perfil de pacientes estudado. Chega de angiografias precoces ou desnecessárias. Podemos então, agora, afirmar: não deixe a ansiedade te dominar!

Referências:

  1. Jentzer JC, Scutella M, Pike F, et al. Early coronary angiography and percutaneous coronary intervention are associated with improved outcomes after out of hospital cardiac arrest. Resuscitation 2018;123:15-21.

  2. Lemkes JS, Janssens GN, van der Hoeven NW, et al. Coro- nary angiography after cardiac arrest without ST-segment elevation. N Engl J Med 2019;380:1397-407.

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